Introdução
O Immram Brain, ou «A Viagem de Bran», é um texto irlandês antigo onde é narrada a viagem de Bran, filho de Febal, ao Outro Mundo. Pertence, convencionalmente, a um grupo de narrativas irlandesas de viagens maravilhosas, os immrama. Embora em listas medievais irlandesas estejam catalogados um número maior de textos deste género, apenas nos chegaram outros três: Immram Curaig Máel Dúin, Immram Curaig Ua Corra e Immram Snédgusa ocus Maic Riagla. Geralmente, inclui-se ainda dentro deste género literário o texto latino Nauigatio sancti Brendani abbatis. O Immram Brain é julgado ser o mais antigo destes textos, sendo a sua composição datada do final do séc. VII ou início do séc. VIII.
Conquanto os textos difiram nos seus pormenores ― alguns são protagonizados por homens do clero em peregrinação, outros por destemidos guerreiros em busca de vingança ―, têm em comum a viagem marítima entre várias ilhas como elemento estruturante da narrativa. Os protagonistas destas navegações, acompanhados por um número definido de companheiros, partem geralmente em busca de uma ilha específica (por vezes de uma abundância idílica) passando por outras de caminho. As ilhas semeadas ao longo do percurso dos viajantes são geralmente definidas por uma característica peculiar, por vezes maravilhosa (e.g. habitada por aves falantes), e os episódios de visita são geralmente fechados em si mesmos, com uma conclusão moralizante que decorre das peripécias. Tanto no Immram Brain como na Nauigatio, o mote para a busca da ilha é dado por uma figura visitante, que descreve ao protagonista uma terra idílica. Entre estes cinco textos há ilhas e motivos partilhados, assim como episódios semelhantes, em quantidade variável.
A proximidade entre os textos irlandeses e a Nauigatio, assim como, principalmente no caso do Immram Brain, a mistura de elementos mitológicos célticos com elementos cristãos, motivaram desde cedo um fértil debate sobre a origem destas histórias. A sua primeira expressão seria, afinal, secular ou cristã? Dificilmente se pode considerar que foram atingidas conclusões definitivas, existindo ainda vozes dissonantes. No entanto, a crítica mais recente considera que o motivo das navegações terá tido origem na expansão de episódios de viagem em vitae latinas ― é possível que uma versão inicial da Nauigatio tenha sido o primeiro dos immrama. Poderão constituir, ainda, um comentário sobre as viagens de peregrinação marinha frequentemente encetadas pelos monges do Cristianismo céltico.
O Immram Brain é, por vários motivos, um texto particular dentro deste género. Ao contrário dos restantes, o texto é sobretudo poético, inserido numa moldura de prosa. Além disso, a secção da viagem propriamente dita não é, proporcionalmente, tão extensa como nos outros immrama. Por este motivo, há quem defenda que o texto deve antes ser considerado uma echtrae ou «aventura», um tipo de narrativa que, com menos foco na viagem, envolve também uma passagem para o Outro Mundo feérico (localizado, por vezes, por baixo de lagos ou montes) estimulada por um visitante ou objecto de lá proveniente ― na verdade, o Immram Brain aparece também numa das listas medievais com echtrae no seu título, em vez de immram. Assim, no Immram Brain, os navegantes visitam apenas dois lugares, a Ilha da Felicidade e a Terra das Mulheres, embora se deparem também com outras maravilhas pelo caminho. Destaca-se o encontro com Manannán mac Lir (divindade do mar na mitologia céltica), que lhes descreve um reino no fundo do mar, sobre o qual Bran navega, e lhes declama um poema profético sobre o nascimento de Mongán mac Fíachnai. Trata-se de uma personagem histórico-lendária (um príncipe irlandês que terá morrido no início do séc. VII), e o texto descreve como esta criança terá uma natureza semi-divina, sendo óbvio o paralelismo com Cristo. Este segmento é, portanto, particularmente ilustrativo do sincretismo que caracteriza os immrama no geral.
Bibliografia
The Otherworld Voyage in Early Irish Literature – An Anthology of Criticism, editado por Jonathan M. Wooding. Dublin: Four Courts Press, 2000.
Radner, Joan Newlon. “Irish Literature: Voyage Tales.” In Dictionary of the Middle Ages vol. 6, editado por Joseph R. Strayer, 550-552. Charles Scribner’s Sons: New York, 1985.
Imrum Bruín Meic Febuil Andso ocus a Eachtra Annso Síss
[1] Cóeca rand ro-gab in ben a tírib ingnad for lár in t(a)ige do Bran mac Febail óro-boí a rígthech lán di rígaib, a nnád-fetatar can do-lluid in ben óro-bátar ind liss dúntai.
[2] Is ed tossach in scéoil. Im-luid Bran láa n-and a oenur i comocus dia dún. Co-cúalai a céol íarna chúl. A ndon-écad tara éssi ba íarna chúl béus no-bíth a céol. Con-tuil asennad frissa céol ara bindi. A ndo-foisich asa chotlad co n-accai in cróeb n-aircit fua bláth ḟind ina ḟarrud, na-pu hasse etarscarad a blátha frissin croíb. Do-bert íarom Bran in croíb ina láim dia rígth(a)ig. Óro-bátar inna sochaidi isind rígth(a)ig co n-accatar in mnaí i n-étuch ingnad for lár in t(a)ige. Is and cachain in caecait rand-so do Braun, arron-chóalai in slóg, ocus ad-condarcatar uili in mnaí.
[3] Cróeb dind abaill a hEmain,
do-fet samail do gnáthaib,
gésci findarc(a)it forra
abrait glana co mbláthaib.
[4] Fil inis i n-etarcéin
imma-taitnet gabra réin,
rith find friss’ toíbgel tonnat
cethrar cossa fos-longat.
[5] Is lí súile, sreth íar mbúaid,
a mmag for-clechtat in tṡlúaig;
consna curach fri carpat
isin maig des Findarcat.
[6] Cossa findru(i)ne foë;
taitni tria bithu gnóë;
caín tír tria bithu bátha
for-snig inna hilblátha.
[7] Fil and bile co mbláthaib
fors-ngairet éoin do thráthaib,
is tre cho(i)cetal is gnáth
con-gairet uili cach tráth.
[8] Taitnet líga cach datha
tresna maige moíthgnatha;
is gnáth sube, sreth imm chéul,
isin maig des Arcatnéul.
[9] Ní gnáth ecoíniud ná mrath
i mruig deanda etargnath;
ní-bí nach guth garc fri cró(a)is
acht mad céul mbind friss-ben cló(a)is.
[10] Cen brón, cen dubai, cen bás,
cen nach galar, cen indgas:
is ed etargnae nEmnae,
ní comtig a comamrae.
[11] Caíne tíre adamrai
ata comgnú(i)si cadli,
asa rodarc find fiä[11],
ní frithid boith i ciä.
[12] Má ad-cetha Aircthech íar tain
for-snig dracoin ocus glain,
do-snig a mmuir fri tír toinn,
trillsi glana asa moing.
[13] Moíni, dússi cach datha
i Cíuin, cani-étatha?
étsecht fri céul co mbindi,
óol fíno cen ingrindi.
[14] Carpait órdi íar Maig Réin
taircet la tu(i)le don gréin ;
carpait aircit i Maig Mon
ocus crédum(a)i cen on.
[15] Graig óir buidi and for srath,
graig aile co corcardath,
graig aile olaill tar aiss
co ndath nime uileglaiss.
[16] Do-feith la turcbáil ngréne
fer find for-osndi réde;
redid mag find friss-mben muir,
mesc(a)id fo(i)rci co-mbi fuil.
[17] Do-fet in slóag tar muir glan,
don tír don-aidbri imram;
imrat íarom dond liic léur
asa-comérig cét céul.
[18] Can(a)id airfitiud dond tṡlóg
tre bithu sír, nád-bí tróg;
tormaig céol co córib cét,
ní-frescat aithbe ná éc.
[19] Emnae ildelbach fri rían,
bésu ocus, bésu chían,
i fil ilmíli brecc mban;
immus-timchella muir glan.
[20] Márod-chó(a)la ló(a)d in chiúil,
isnach énán a hImchíuin,
do-fet banchuire di á
cusa cluichemag i-tá.
[21] Do-fet soíre la slá(i)ni
don tír friss-ferat gá(i)ri;
is i nImchíuin co n-ó(a)gi
do-fet bóane la há(i)ni.
[22] Is lá suthaine síne
do-snig arcat i tíre;
aill érfind for idna réin
foa-feid a grís a gréin.
[23] Graibnid in slóg íar Maig Mon,
clu(i)che n-álaind nád indron;
i mbruig mbrecht óas ma(i)sse mét,
ní-frescat aithbe ná éc.
[24] Étsecht fri céul in[d] adig
ocus techt i nIldathaig;
mbruig mbrecht, liig óas ma(i)sse mind,
asa-taitni in nél find.
[25] Fil trí coícta inse cían
isind oceon frinn aníar;
is mó Érinn co fa dí
cach aí díïb nó fa thrí.
[26] Ticfa mórgein íar mbethaib
nád-biä for forclethaib;
mac mná nád-festar céle,
gébaid flaith na n-ilmíle.
[27] Flaith cen tosach cen forcenn,
do-rósat bith co coitchenn;
dos-roirbe talam ocus muir,
is mairc bíäs foa étuil.
[28] Is é do-rigni nime,
cé(i)n-mair dia-mba findchride;
glainfid slúagu tre linn nglan,
is é ícfas for tedman.
[29] Ní dúib uili mo labrae,
ci ad-fes a mmóramrae;
étsed Bran de betho bró
a ndi ecnu ad-féat dó.
[30] Ná tuit fri lige lescae;
nachid-throíthad do mescae;
tinscan imram tar muir glan
dús in-rísta Tír na mBan.
[31] Luid in ben úadaib íarom, a nnád-fetatar cia-luid, ocus birt a croíb lee. Leblaing in chroíb di láim Brain co mboí for láim inna mná, ocus ní-boí nert i lláim Brain do gabáil inna croíbe.
[32] Luid Bran íarom ara bárach for muir. Trí nónbuir a lín. Oínḟer forsna trib nónburaib dia chomaltaib ocus comaísib. Óro-boí dá láa ocus dí aidchi forsin muir co n-acc(a)i a dochum in fer isin charput íarsin muir. Canaid in fer ísin tríchait rand n-aile dó, ocus sloindsi dó, ocus as-bert ba hé Manannán mac Lir, ocus as-bert boí fair tuidecht i nÉrinn íar n-aimseraib cíanaib, ocus no-gigned mac óad, .i. Mongán mac Fiachnai, is ed forid-mbíad.
[33] Caíne amrae lasin mBran
ina churchán tar muir nglan;
os mé im charput do chéin,
is mag scothach imma-réid.
[34] A n-as muir glan
don noí bro(i)nig i-tá Bran,
is mag meld co n-immut scoth
damsa i carput dá roth.
[35] At-chí Bran
lín tonn tibri tar muir glan;
At-chíu cadéin i mMaig Mon
scotha cennderca cen on.
[36] Taitnit gabra lir i sam
sella roisc ro-ṡiri Bran;
bru(i)ndit scotha srúaim de mil
i crích Manannáin maic Lir.
[37] Lí na fairci fora-taí,
geldod mora imme-raí,
ros-sert buide ocus glass:
is talam nád écomrass.
[38] Lingit ích bricc ass de brú,
a mmuir find for n-aicci-siu;
it loíg, it úain co ndath,
co cairdi, cen imarbath.
[39] Cé ad-chetha oínchairpthech
i mMaig Meld co n-immud scoth,
fil mór d’echaib fora brú
cen suide, nád aicci-siu.
[40] Mét in maige, lín in tṡlóig,
taitnit líga co nglanbóaid;
findruth aircit, drep[p]a óir,
táircet fáilti caich imróil.
[41] Clu(i)che n-aímin n-inmeldag
aigdit fri find-imborbag,
fir is mná míne fo doss
cen peccad cen immarboss.
[42] Is íar mbarr fedo ro-sná
do churchán tar indrada,
fil fid fo mess i-mbí gnóe
fo braine do beccnoe.
[43] Fid co mbláth ocus torad
fors-mbí fíne fírbolad,
fid cen erchra[e] cen esbad
fors-fil du(i)lli co n-órdath.
[44] Fil dún ó thossuch dú(i)le
cen aíss, cen forbthe n-ú(i)re,
ní-frescam de mbeth anguss,
nín-táraill int immarbuss.
[45] Olc líth do-lluid ind nathir
cosin n-athair dia chathair,
saíbsi sec[h] recht i mbith ché
co-mbu haithbe nád buë.
[46] Ron-ort i croís ocus saint
tresa-nderbaid a ṡoírchlaind,
ethais corp crín cró péne
ocus bithaittreb rége.
[47] Is recht óabair o mbith ché
cretem dú(i)le, dermat nDé,
troíthad galar ocus aíss,
apthu anma[e] tria togaís.
[48] Ticfa tessarcon úasal
ónd Ríg do-rea-rósat,
recht find fo-glóisfe[a] muire,
sech bid Día, bid duine.
Esta é a navegação de Bran, filho de Febal, e a sua viagem, que abaixo se segue.
[1] Foram cinquenta as quadras que, no meio da casa, a mulher vinda das terras de maravilhas cantou a Bran, filho de Febal, quando o seu palácio estava repleto de reis, que não sabiam de onde viera a mulher, uma vez que os taludes estavam fechados.[1]
[2] Este é o início da história. Certo dia, Bran tinha ido passear sozinho nas proximidades do seu forte, quando ouviu música atrás de si. Cada vez que olhava para trás, era atrás dele que continuava a estar a música. Por fim, adormeceu com a música, por causa do seu som melodioso. Quando acordou do sono, viu ao seu lado um ramo prateado com flores brancas; e não era fácil distinguir as flores do ramo. Então Bran levou o ramo na mão para o seu palácio. No momento em que a multidão estava no palácio, viram no meio da casa uma mulher com uma estranha veste. Foi então que ela cantou estas cinquenta quadras para Bran, enquanto a hoste as ouviu e todos viram a mulher.
[3] Um ramo da macieira de Emain,
tal que excede os conhecidos,[2]
galhos branco prata sobre ele,
cílios[3] de cristal com flores.
[4] Há uma ilha distante
em torno da qual refulgem cavalos do mar,[4]
curso brilhante contra a onda de alvo flanco;
quatro pés sustêm-na.
[5] É um deleite para os olhos, uma extensão gloriosa,
a planície onde as hostes se exercitam em jogos;
curach contende contra carro
na planície a sul de Findarcat.[5]
[6] Sob ela, pés de bronze branco[6];
brilha através de idades de beleza;
terra formosa através das idades do mundo,
sobre a qual chove uma miríade de flores.
[7] Ali há uma árvore antiga com flores,
sobre a qual pássaros chamam pelas horas,[7]
é em harmonia que têm por hábito
chamar todos em uníssono cada hora.
[8] Refulgem fulgores de todas as cores
através das planícies acolhedoras[8];
É constante a felicidade, acompanhada por música,
na planície a sul de Arcatnél.[9]
[9] Não são conhecidos lamento nem dolo
na terra do bem conhecido forte;
não há qualquer voz rude com aspereza,
mas antes música melodiosa que atinge o ouvido.
[10] Sem sofrimento, sem tristeza, sem morte,
sem qualquer doença, sem debilidade[10]:
é o que distingue Emnae,
não é comum uma maravilha assim.
[11] Beleza de uma terra maravilhosa
cujos aspectos são formosos,
cuja visão é bela e excelente,
não é como estar na neblina.
[12] Se visses depois Aircthech
sobre o qual chovem dracôntias[12] e cristais,
o mar precipita contra terra a onda,
tranças de cristal da sua crina.
[13] Riquezas, tesouros de todas as cores
em Ciúin, não foram eles obtidos?[13]
ouvindo música melodiosa,
bebendo vinho delicioso.
[14] Carros de ouro ao longo de Mag Réin[14]
vêm com a cheia em direcção ao sol;
carros de prata em Mag Mon[15]
e de bronze sem imperfeição.
[15] Lá, no prado, cavalos de um amarelo-dourado,
outros cavalos com cor púrpura,
outros cavalos sobre outros[16]
com a cor do céu todo azul.
[16] Vem, ao erguer do sol,
um belo homem[17] que ilumina a planura;
percorre a planície brilhante contra a qual bate o mar,
agita o oceano até se tornar sangue.
[17] Vem a hoste sobre o límpido mar,
em direcção à terra para onde aplica os remos[18];
remam depois para a grande pedra
da qual se eleva uma centena de canções.
[18] Canta uma melodia para a hoste,
através de longas eras, e não é triste;
a música cresce com coros de centenas:
não esperam decadência nem morte.
[19] Emnae formosa virada para o mar,
talvez seja próxima, talvez distante,
onde há miríades de mulheres de vestes variegadas;
cinge-a o límpido mar.
[20] Se tiver ouvido o som da música,
O canto[19] dos passarinhos vindo de Imchiúin,[20]
vem da altura um bando de mulheres[21]
para o campo de jogos em que está a música.[22]
[21] Chega liberdade com saúde
à terra para onde se derramam risos;
a Imchiúin primoroso
chega perenidade com deleite.
[22] É um dia de permanente bonança
que faz chover prata sobre as terras[23];
uma alvíssima falésia sobre a beira do mar,
que recebe do sol o seu calor.
[23] A hoste corre a cavalo ao longo de Mag Mon,
competição bela que não é fraca,
no campo variegado de desmedida beleza:
não esperam decadência nem morte.
[24] Ouvir música à noite
e ir para Ildathach[24];
campo variegado, gema sobre um belo diadema,[25]
de onde brilha a alva nuvem.
[25] Há três vezes cinquenta ilhas distantes
no oceano a oeste de nós,
é duas vezes maior do que a Irlanda
cada uma delas, ou três vezes.
[26] Sobrevirá, passados séculos, um grandioso nascimento
que não será em lugares elevados[26];
o filho de uma mulher que não conhecerá companheiro,
que tomará o poder sobre os muitos milhares.
[27] Rei sem princípio, sem fim,
que criou o mundo inteiro,
dele são a terra e o mar;
ai de quem lhe causar desgosto.
[28] Foi ele quem fez os céus.
feliz aquele que tiver coração puro:
ele purificará as hostes com águas puras,
será ele a curar as vossas doenças.
[29] Não é para todos vós o meu discurso,
ainda que eu conte a grande maravilha;
que Bran ouça, de entre a multidão do mundo,
o que de sabedoria lhe conto.
[30] Não caias num leito de ócio;
que a tua embriaguez não te subjugue;
dá início a uma viagem sobre o límpido mar
para saber se alcançarás a Terra das Mulheres.
[31] Em seguida a mulher partiu de junto deles, sem que eles soubessem para onde fora, e consigo levou o seu ramo. O ramo saltara da mão de Bran e foi parar à mão da mulher, pois na mão de Bran não havia força para segurar no ramo.
[32] Então, no dia seguinte, Bran partiu sobre o mar. Três grupos de nove homens era o número dos que o acompanhavam.[27] Um homem de entre os seus irmãos adoptivos, dos que eram da sua idade, à frente de cada um dos três grupos de nove. Quando já estava no mar há dois dias e duas noites, viu um homem num carro vindo na sua direcção sobre o mar. Aquele homem cantou-lhe outras trinta quadras, e disse-lhe o seu nome, disse-lhe que era Manannán, filho de Ler, e que após longas eras era chegado o momento de ele ir para a Irlanda, que dele nasceria um filho, que Mongán, filho de Fíachnae, seria o nome dele. Então cantou-lhe estas trinta quadras:
[33] É uma maravilhosa beleza para Bran
no seu pequeno curach sobre o límpido mar;
e eu no meu carro à distância,
é uma planície florida que ele percorre.
[34] Aquilo que é um límpido mar
para a nau com proa em que está Bran,
é uma aprazível planície com abundância de flores,
para mim, num carro de duas rodas.
[35] Bran vê
muitas ondas que rebentam sobre o límpido mar;
Eu vejo-me a mim mesmo em Mag Mon,
flores sem imperfeição coroadas de vermelho.
[36] Refulgem cavalos do mar no verão:
a vista que Bran alcançou com o olhar;
as flores vertem uma corrente de mel
na terra de Manannán, filho de Ler.
[37] O esplendor do pélago sobre o qual te encontras,
a cor brilhante do mar em que remas,
espalhou amarelo e verde:
é terra que é firme.
[38] Salmões variegados saltam dele,[28] do ventre,
do mar brilhante que tu percorres com o olhar;
são vitelos, são cordeiros coloridos,
amistosos, sem discórdia.
[39] Ainda que vejas um só auriga
em Mag Meld[29] rico em flores,
há muitos outros cavalos no seu seio,
que tu não vês.
[40] A vastidão da planície, a multidão da hoste,
Refulgem fulgores com pura glória;
um belo rio de prata, escadas[30] de ouro,
provocam a alegria de toda a abundância.[31]
[41] Um jogo agradável, muito aprazível,
jogam-no em bela competição[32]
sob árvores homens e mulheres plácidos,
sem pecado, sem transgressão.
[42] Foi ao longo do topo dum bosque que navegou
sobre leivas[33] o teu pequeno curach;
Há um bosque com fruto[34] onde há beleza,
sob a proa do teu barquinho.
[43] Um bosque em flor e com fruto,
nos quais há[35] a genuína fragrância da vinha,
bosque sem putrefacção, sem defeito,
onde há folhas cor de ouro.
[44] Nós somos desde o princípio da criação
sem idade, sem corrupção da juventude,[36]
não esperamos enfraquecer,[37]
não nos visita o pecado.
[45] Nefasto o dia em que a serpente chegou
ao pai na sua sede,[38]
perverteu-o, além do lícito, neste mundo,
de modo que passou a existir decadência, que não é original.
[46] Destruiu-o com gula e ganância,[39]
através das quais lhe arruinou a linhagem,
foi o corpo fenecido para um antro de dor[40]
e eterna morada de castigo.
[47] É a lei do orgulho neste mundo
acreditar em criaturas, esquecer Deus,
ser subjugado às doenças e aos anos,
a morte da alma pelo engano.
[48] Virá uma nobre salvação
do Rei que criou as vastidões,[41]
uma lei justa que o Senhor porá em movimento,[42]
ele será tanto Deus quanto homem.[43]