Porque deveria eu deixar o trabalho de sapo
  Acocorar-se na minha vida?
Não poderei eu usar o meu engenho como forquilha
  E afastar a besta?

Macula seis dias da semana
  Com o seu veneno nauseabundo —
Apenas para pagar umas contas!
  É um exagero.

Muita gente vive do seu engenho:
  Conferencistas, ciciosos,
Canalhas, campónios, comedores —
  Não acabam pobres;

Muita gente vive em becos
Com fogueiras em baldes,
Comem fruta caída e sardinhas enlatadas —
  Parecem gostar. 

Os seus garotos andam descalços,
  As suas esposas indescritíveis
São magras que nem galgos — e, no entanto,
  Ninguém morre mesmo à fome.

Ah, se eu tivesse coragem
  Para gritar Que se lixem as vossas reformas!
Mas eu sei, demasiado bem, que é disso
  Que os sonhos são feitos:

Porque algo suficientemente atajeiro
  Também se acocora em mim;
As suas coxas são pesadas como azar
  E frias como a neve, 

E nunca me deixarão adular
  Para conseguir
A fama, a rapariga e a riqueza
  De uma só assentada. 

Não digo que um representa a
  Verdade espiritual do outro;
Mas digo que é difícil perder um,
  Quando ambos tens.

Larkin, Philip, The Complete Poems. ed. Archie Burnett. 2012. Londres: Faber & Faber, 2018.

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