Miguel Andrade
É notável hoje, como o era na Idade Média, que uma ilha relativamente remota e escassamente povoada seja reconhecida internacionalmente pela vitalidade da sua poesia. A Islândia, de onde nos chega esta colectânea de poemas, pela mediação de Amadeu Baptista, possui uma ligação íntima e constante com a poesia, desde a sua colonização em c. 870 d.C. O verso pertence ao quotidiano dos islandeses e a sua tradição poética é vasta e prolífera. Nos termos do historiador dinamarquês Saxo Grammaticus (1160-1220), «A diligência dos homens da Islândia não deve ser envolta em silêncio». Pelos Nossos Corações passa a Linha de Fogo desvela-nos a poesia do mesmo povo, embora de diferente cronologia. Estes poemas foram originalmente publicados entre 1937 e 1991, pelas mãos de dezoito poetas (quatro dos quais mulheres). A selecção foca-se, em grande parte, num período de transição, da libertação da poesia islandesa dos seus moldes tradicionais, sacudindo-se da aderência estrita a poemas de estrutura regular, rimados e aliterados, e dos velhos e repetidos temas (uma poesia lírica, a dedicação à natureza e um ideário romântico, por vezes nacionalista e individualista). Nesta fatia do século XX, encontramos uma Islândia em mudança, abrindo-se ao mundo, e uma poesia acompanhando o seu passo, com os anos 40 como charneira desta articulação.