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Maria Rita Furtado

110. Isabela Figueiredo, A Gorda

110. Isabela Figueiredo, A Gorda

Maria Rita Furtado

Ao abrir A Gorda, o primeiro romance de Isabela Figueiredo, além de epígrafes que poderiam ser consideradas comuns, na medida em que são excertos de textos, deparamos com uma «epígrafe sonora». Tal epígrafe não consiste em citações de letras de músicas, como se poderia esperar, mas antes numa lista de nomes de artistas e de títulos de músicas, ordenados cronologicamente. A lista é tão variada que não pode deixar de surpreender: ver nomes como Lou Reed e Ornatos Violeta ao lado de Abba e Amor Electro não é coisa habitual. A primeira curiosidade que o livro despertou foi, portanto, perceber o que faziam «Language is a Virus», de Laurie Anderson, e «Amanhã é Sempre Longe Demais», dos Rádio Macau, na mesma página, uma vez que não parece que a escolha das canções tenha sido acidental. Assim, foi preciso pensar nas letras das músicas e tentar descortinar o denominador comum: quase todas descrevem amores infelizes e todas contam histórias de vidas que ficaram por viver, pelas mais variadas razões. E é disso que Isabela Figueiredo nos fala: da vida não vivida de Maria Luísa, a personagem principal de A Gorda, mas também, e acima de tudo, da vontade que ela tem de a viver.

63. Rebecca Solnit, The Faraway Nearby

63. Rebecca Solnit, The Faraway Nearby

Maria Rita Furtado

«What's your story? It's all in the telling. Stories are compasses and architecture (…) and to be without a story is to be lost.» (p. 4) Assim começa The Faraway Nearby (publicado em 2015 pela Quetzal com o título Esta Distante Proximidade), um dos livros mais recentes da escritora norte-americana Rebecca Solnit, que se apresenta como um mapa feito de histórias, através do qual a autora tenta guiar-se após uma série de acontecimentos que seriam capazes de interromper as histórias acerca de si própria e do mundo, pelas quais se regera até então: o Alzheimer da mãe, o fim de uma relação, a possibilidade de ter cancro. É preciso voltar a unir as pontas e fazer sentido de caminhos que parecem não levar a lado nenhum, e isso faz-se contando histórias e ligando-as umas às outras, ponto por ponto.

45. Lydia Davis, Can't and Won't

45. Lydia Davis, Can't and Won't

Maria Rita Furtado

Numa entrevista publicada no site Literary Hub, Lydia Davis fala de aprender línguas estrangeiras (no caso, norueguês) e informa o leitor de que não usa dicionários: «No, I never use dictionaries. Then there would have been no challenge. No intellectual challenge at all!» A ideia de desafio é fundamental para o que a autora explica tanto sobre a aprendizagem de uma língua estrangeira (trata-se de um jogo, de um enigma que deve ser resolvido), como também sobre a sua própria escrita. O que torna interessante a leitura de Can't and Won't – a colecção mais recente de contos de Lydia Davis, publicada em 2014 e recentemente traduzida pela Relógio d'Água com o título de Não Posso Nem Quero – é, precisamente, a ideia de enigma.